sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Barcos de Papel




Barcos de papel
Guilherme de Almeida

Quando a chuva cessava e um vento frio
Franzia a tarde tímida e lavada,
Eu saía a brincar pela calçada
Nos meus tempos felizes de menino

Fazia de papel toda uma armada
E, estendendo meu braço pequenino
Eu soltava os barquinhos sem destino,
ao longo das sarjetas, na enxurrada...

Fiquei moço. E hoje sei, pensando neles,
Que não são barcos de ouro meus ideais
Que são feitos de papel,tal como aqueles

Perfeitamente, exatamente iguais...
Que os meus barquinhos, lá se foram eles!
Foram-se embora e não voltaram mais!

sexta-feira, 30 de março de 2012

Denuncio o Evangelho

DENUNCIO O EVANGELHO
Moysés Amaro Dalva

“Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas! “

Denuncio o evangelho,
O evangelho ferrado
Que se alienou do Homem
E está mancomunado
Com as mentiras diurnas
Do mundo, cheio dos “istas”.

Denuncio o evangelho
Denunciado por Cristo
Que já foi crucificado
Sobre o Calvário moderno
Destes sistemas exernos
De justiça social,
E que ora está vendido

Aos livros-fiscais, aos caixas,
Cujos mercados em baixa
Faz do Homem, marginal.

Denuncio sem delongas
O evangelho-surpresa,
Sem o convívio da mesa.
De mil vidas confundidas
Sem trabalho e sem comida,
Vazias de teto e amor...
Onde a vida, reprimida,
Não tem repouso ou guarida,
Descanso, paz, segurança....

Denuncio o evangelho
Da criança sem carinho,
Cujo berço, lar e ninho
São trapos e viadutos.
Assumindo, por consolo,
A rua, sempre vazia
E a tarde -sem pão- sombria,
Comprometendo o amanhã.

Denuncio como posso
O evangelho do pó
Que emergiu das calçadas,
Assoprando pigmentos
Sobre as almas dos sedentos,
Sedentos de expiação!
Sobre as almas magoadas
Pelas roscas do infortúnio
E as malhas da humilhação.

Denuncio o evangelho
Que não serve para o Mundo,
Que não tem poder profundo
Pra multiplicar os Pães
E os peixinhos da Verdade....
Que se abateu sobre a noite
E atormenta a cidade
Em nome das repressões.
**

BALDE DE LIXO

BALDE DE LIXO
Moysés Amaro Dalva
É mister que se coloque
Um balde de lixo ali;
Não importa o preconceito
E os conceitos daqui;
Não importa o ambiente
Que é falso, embora decente.
Eu quero um balde de lixo
Deposto no canto, ali!
Quero ver nele atirados
Esses sorrisos fingidos,
Esses olhares matreiros
Que riem de homens traídos.
Quero ver no fundo dele
Os farrapos miseráveis
Das etiquetas rasgadas
Das falsas donzelas de hoje.
Quero ver nele jogados
Os soutiens poluídos
E os lenços maculados
Por sêmem e falso amor
Eu quero um balde de lixo
Quebrando todo o conceito
Destes tapetes que aparam
Em seu silêncio macio
Todo o amor fictício,
Todo o requinte dos vícios,
Todo o ritual de luxuria
Que, sob portas fechadas,
Tem-se cometido aqui.
Eu quero um balde de lixo,
Cuja presença relembre
Os “baixos” tristes da vida;
Cujo aspecto insidioso
Rememore o abismo fundo
Que, como poço nefando,
Dentro da alma do mundo,
Vá consumindo o orgulho
Dos moradores da casa.
Na sala estética e quente
Eu quero um balde de lixo
Aqui, onde o olhar consome,
Para que ninguém se esqueça
Que por mais que surja e cresça
Não transcende de ser pó
Que um dia tornou-se homem.
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